quarta-feira, 30 de março de 2016

Devolta a vida - Violão Giannini 1971



DO LIXO AO LUXO ...

Eis que chegou aqui na G.M um violão que a principio o dono dizia ser um Di-Giorgio. Logo ja percebi que não era, mas sim um Giannini pelo formato, tamanho e construção.

Este modelo Giannini tem a mão entalhada, por isso as pessoas as vezes confundem com o Di-Giorgio, ainda mais este que estava sem a etiqueta Giannini colada por dentro.

O violão chegou aqui assim:


Foi encontrado no lixo, o dono pediu uma reforma geral e repintura, coisa inviável para este tipo de instrumento com tantos defeitos, o preço final da restauração completa daria para comprar mais de um violão novo e  atual, então o dono desistiu. Este violão ficou parado um tempão aqui na luthiaria e o dono acabou me dando de presente. Resolvi recolar e deixar este como peça de decoração aqui na parede da G-Marx.



Os trastes estavam se soltando, o braço empenado e descolado em pontos criticos. O fundo, as laterais e o cavalete também ja haviam se descolado, por isso jogaram o violão no lixo. Lixo para alguns, alegria para outros .. 
A "mão" entalhada do Giannini, hora confundido com Di-Giorgio.



Iniciando as etapas de restauração, eu encontrei a etiqueta original do violão, estava perdida por dentro dele. Giannini !!! como eu havia dito ao dono rsrs. Pelo tipo da etiqueta eu ja sei que é dos anos 70, restando então pesquisar e saber melhor sobre este modelo de violão. 

Descobri que o violão em questão é um modelo bem dificil de se encontrar, é o primeiro modelo do SERESTA I.

O seresta é um violão até que comum de se encontrar, tamanho grande, é denominado SERESTA II, originalmente este violão era fabricado na década de 70, e leva a mão entalhada. No final dos anos 80 surgiu uma reedição do modelo seresta, a mão não é entalhada e não tem diferença de tamanho como os serestas I e II de primeira edição.

A DIFERENÇA NO TAMANHO

O que torna esse violão um modelo dificil de ser encontrado é o seu tamanho. o Seresta I é tamanho médio, e foram fabricados em menor quantidade quando comparamos ao Seresta II que é tamanho grande. Isso estamos falando dos modelos dos anos 70, enquanto a reedição do Seresta do final dos anos 80 em diante é um tamanho padrão e unico.


VIOLÃO SERESTA REEDIÇÃO DOS ANOS 80:

Note que este ja não tem mais a mão entalhada
 A etiqueta interna do Seresta modelo reedição:

OUTRA CURIOSIDADE A RESPEITO DESTE VIOLÃO

Pesquisando mais a fundo sobre o violão descobri o ano de fabricação: 1971.

Descobri também, medindo sua escala que este violão é de escala curta, com medida de 24 polegadas, enquanto os outros violões padrão a escala é 25.5 polegadas.

Mais uma vez estava certo quanto a época de fabricação. O que me deixou mais intrigado em querer arrumar o violão é quanto a sua madeira.

O tampo é feito de Pinheiro do Paraná (Araucária)  E sendo paranaense eu adorei a ideia rsrs.

O fundo e as laterais deste violão são de imbuia, cavalete e escala em jacarandá baiano, braço em cedro com espelho em imbuia.

Outro fato curioso é o tamanho médio, e comparado aos modelos pequenos que são ainda mais raros de se encontrar como o Giannini Pinocchio 1° modelo, estes violões eram popularmente conhecidos como "violão para filho de rico" recomendado a crianças e jovens que estavam iniciando a jornada no mundo da musica com o violão.

No final dos anos 70 a Giannini passou a usar o Pinho sueco ao invéz do Pinheiro do Paraná, como podemos ver neste catálogo de 1976/1977 da Giannini:


Note que a madeira é mais clara, e os veios são retos, padrão muito diferente do tampo de araucária. O violão da foto é o modelo Pinocchio que passou do tamanho pequeno para tamanho "standard" no final dos anos 70.

O entalho na mão do violão também mudou o desenho:

SERESTA I Tampo em araucaria



 SERESTA I Tampo em pinho suéco

A reedição do Seresta dos anos 80 não tem nenhum entalhe na mão:


Agora sabendo tudo sobre o violão, segue os  reparos









A ETIQUETA ORIGINAL DOS ANOS 70

Estava perdida dentro do violão, consegui recupera-la, não esta em perfeito estado mas já é grande coisa ter a etiqueta original no lugar novamente.


Aqui esta o violão pronto.. A principio deixei sem os trastes mas ficou horrivel a tocabilidade.. Porem pude ter uma melhor noção de seu som .. E é um som maravilhoso, e alto apesar das dimensões de sua caixa-acústica.



Encontrado no lixo ele voltou a vida. Mais um para a coleção rsrs

Detalhes do tampo em Pinheiro do Paraná (araucária)



LINHA DO TEMPO:


SERESTA I * 1970 - 1975 (Tampo em Araucária)


SERESTA I * 1976 - 1979 (Tampo em Pinho Suéco)


 SERESTA I * 1987- 1995 (Reedição)




O próximo passo é colocar os trastes e reforçar o braço com um tensor, a ideia é converte-lo para usar cordas de aço.

Para isso foi preciso retirar a escala com todo cuidado:





Este é um processo longo e muito delicado, afinal não posso de forma alguma danificar a escala, pois ela deve se manter perfeita para remontagem final do violão, garantindo 100% sua originalidade.



O processo envolve aplicar calor para soltar a colagem antiga.. Nestas horas todo o cuidado é pouco, afinal se exagerar na quantidade de calor a madeira da escala vai entortar e estragar ...




Uffa !!! Escala removida com sucesso.. hehehe

Saiu limpa, sem lascas.. Perfeito.


Repare no espaço entre o corpo e o braço.. Detalhe que será corrigido adiante.




Agora envolve outro processo... O braço estava levemente empenado, montei esta desempenadeira de forma bem simples e atravéz de um processo de umidificação/calor consegui deixar este braço bem reto para seguir com o trabalho.





Detalhes da desempenadeira, note que o braço esta bem reto.



A cola antiga deve ser totalmente removida do braço e da escala.



Marcamos o centro do braço para fazer a cavidade do tensor.




O correto é usar uma ferramenta elétrica chamada de tupia para fazer a cavidade do tensor, mas eu preferi fazer esta manualmente com um formão de 1/4 ponta ligeiramente afinada especialmente para este trabalho.

Os "furinhos" já estão na profundidade correta e ajudam na hora da retirada de material com o formão.



 Cavidade feita, hora de encaixar o tensor



O tensor deve entrar justo na cavidade, sem folgas.. Por isso preferi fazer este trabalho manualmente.



 Ficou bem justo, perfeito..

Próxima etapa é recolar a escala no lugar, ja previamente com os trastes colocados. Os trastes escolhidos são Dunlop médio-jumbo em alpaca.




 2 dias depois:


Ficou muito boa a colagem :)






Agora é só retificar os trastes, hidratar a escala, colocar as cordas, fazer a regulagem final e pronto hehehe



 Trastes retificados, escala hidratada com cera de carnaúba


Ai esta, e agora com tensor regulavel :)


Foi feito um reforço interno no cavalete com 2 pinos de aço, interessante lembrar que o encordamento não deve ultrapassar o 0.10 neste violão, apesar dos reforços ele ainda é um violão antigo e por uma serie de fatores devemos respeitar isso e não abusar do pobre senhor Giannini rsrsrs



Ficou bonito o par de Gianninis "setentões" heim hehehe

 Quanto ao som...

Maravilhoso, com graves lindos... Apesar da caixa acústica pequena o som tem ótima propagação, um som vivo e bem definido.

Tocabilidade muito macia graças a escala curta de 24"


VIOLÃO GIANNINI SERESTA I

Ano: 1971
Tampo: Araucária
Roseta: mosaico em madeira
Faixas e fundo: Imbuia
Braço: Cedro
Escala: Jacarandá baiano
Espelho: Imbuia, entalhada a mão.
Cavalete: Jacarandá baiano com filetes





Acompanhe o video do som deste violão :




Atualização 12/09/2017*

O violão é meu (claro eu vou ficar com ele para o resto de vida rsrsrs), então como foi convertido para aço achei interessante fazer as marcações na escala. Tanto para diferenciar quanto para auxiliar também nas aulinhas de violão que rolam por aqui na GM. Vamos acompanhar o processo:















 Aguardando a cura da cola...




 Aplainando os "dots" na escala para ficar tudo certinho.




 Perceba que ele já tinha as marcações na lateral da escala




Ficou ainda mais bonito não concordam ? 😀😀😀😀😀